sexta-feira, dezembro 02, 2005

[ Meu Fardo ]

Mais um dia de trabalho, olho para o despertador são sete horas, está na hora de se levantar, vou ao banheiro me olho no espelho e observo minha olheira aumentando a cada dia. Sinto-me cansado, perdido, desolado, meu amor está longe de mim, apenas irei ver sua presença daqui a quinze dias melhor lavar o rosto e escovar os dentes enquanto a água do chuveiro esquenta nessa cidade fria. Entre tantos pensamentos, me vejo sozinho, apenas minha fé continua forte, sei que Deus está me olhando, julgando meus atos, desaprovando os fatos dessa vida de sofredor egoísta que sou.
Minha vida parece estar escorrendo pelo ralo do banheiro, é melhor acabar de fazer a barba e me arrumar logo, não posso mais chegar atrasado, senão descontam do meu salário. Sei que, apesar de tudo que faço nada é o bastante para ninguém, mas sei que Deus está me vendo e reconhecendo, sei que no final ele será minha redenção, minha benção, minha única razão de viver. Fico no trabalho horas no telefone marcando minhas reuniões, enviando as propostas por e-mail e vendo as fotos do meu amor, meu estepe, minha conselheira, minha namorada.O tempo voa, não para, já são seis e meia, hora de voltar pra casa, minha prisão domiciliar, preciso de algo para beber, sinto sede, me sinto seco, sinto um vazio dentro de mim.Melhor me deitar logo, amanhã começa meu fardo novamente, me arrumo na cama, ligo a televisão para distração, ver a desgraça do mundo, apenas desastres nas notícias, guerras, miséria, toda a degradação da humanidade como em um filme.
Preciso de minha benção antes de dormir, rezo o meu pai nosso de cada dia, pego a foto de minha namorada e vou apagando devagar, as luzes estão opacas, o quarto parece estar diminuindo, adormeço pensando nela.
Acordo cego pela luz do Sol de minha janela, pego o relógio em cima da cabeceira para ver às horas, ainda é cedo, mas preciso me levantar. Vou em direção da geladeira, pego o leite, a manteiga e vou preparando o meu café da manhã.
Estou voltado ao meu quarto quando vejo no corredor uma carta em baixo da porta, pego a carta e vejo o nome do meu amor, abrindo o envelope até o caminho do meu quarto e me deito na cama para ler. Começo a ler, e em cada linha uma lágrima escorre de meus olhos, pareço não acreditar no que estou lendo, fui trocado, enganado, vendido como mercadoria, meu coração está na mão dessa açogueira, que está despedaçando e cortando ele aos poucos, jogando todos os momentos bons no lixo, como se não fosse mais útil, apenas carne pútrida e mofada. Me vejo em prantos, desesperado, sem chão, sem rumo, Deus me ajude, aquela luz no fim do túnel se apagou, minha última esperança foi embora.
Estou de luto, faltei no trabalho, não podia me afundar mais do que já estou, preciso de ar, vou acender outro cigarro e preparar um drink. Não agüento mais beber, não quero mais viver, a morte não parece o suficiente, preciso de algo muito forte para complementar a minha desgraça. Vou andando de bar em bar, contando minha história, minha vida, minha desgraça.Como em um simples gesto, perdemos tudo o que construímos, como pode esquecer tão facilmente o que plantamos nesse amor sem fim.
Fim, que bela palavra, ela determina o ponto nessa linha do tempo que criamos ao namorarmos. Não sinto mais meus dedos, deve ser esse frio da cidade, acendo outro cigarro para espantar os mosquitos, nesse beco escuro em que me encontro.
Deus apareça me dê o seu amor, me dê o seu conforto, o seu perdão, se errei com minha amada, se errei nessa vida abastada. Não sei mais onde devo ir, seguir qual caminho, meu único objetivo me deixou aqui sozinho, talvez não haja Sol que acenda a chama do amor que perdi, daquele rosto que nunca esqueci, desse amor que não tem mais como prosseguir. Estou embriagando, pareço um mendigo andando pelas ruas, sem casa, sem família, sem nada.
Chego em casa derrubando os móveis, tentando achar o interruptor da luz, não consigo achar, vou no tato pelas paredes até meu quarto e me deito na cama. Agradeço a Deus pela força, minha fé resiste, minha raiva cresce gradativamente, faço um juramento inesquecível para meus atos.
Peço a Deus sua benção antes de adormecer, jurei nunca mais me deixar levar pelos meus sentimentos, de me entregar de corpo e alma, resolvi seguir aquele versículo da bíblia, “pobre do homem, que acredita na palavra do homem”.
Adormeço entre as bebidas e as bitucas de cigarro, para acordar no outro dia, lembrando de nunca mais repetir estes atos, apenas me preparando para essa nova vida que há de vir, deixando o destino falar por mim.